Palavras do autor
Perambulava eu, após 70 quilômetros de estrada esburacadas, em uma
estância perdida entre Bagé e Lavras do Sul. Encontrava-me num desses almoços
típicos daquela parte do mundo, em que pessoas desconhecidas umas das outras
acabam compartilhando a mesma mesa, ao sabor aleatório da hospitalidade
daquelas plagas. Aí um cavalheiro, que eu não conhecia, e que não sabia quem eu
era, me disse:
- Estou lendo um livro muito legal, chama-se " A árvore que falava
aramaico".
Conhece?
Foi um lindo dia.
Chuva que a alma é quem sorve, vira papel pra o escrito
Perdi palavras... do livro azul da memória
e fui ler sobre a
história que me traz o céu do dia...
conheci as sesmarias
e os cavaleiros leitores.
Andamos nos
corredores e saboreamos o arcaico
depois de muito após
Cristo, despaginados da fé
sei que entre a “Lavra
e Bagé” inda se ouve aramaico.
Uma vez - neste caminho
- um tal cantor de Olhos d´água
destes que o corpo
deságua em mil palavras – Francisco
por seguidor eu me
arrisco contar em verso o que sei
pois imagino ser Rei
o pregador que solito
traduz a força de um
rito e humildemente absorve:
chuva que a alma é
quem sorve vira papel pra o escrito.
Era um tropeiro
cruzando, adiante, um rádio de pilha
rodeado pela coxilha
e o infinito celeste...
marcas no rosto do
agreste, vinha no mas de ponteiro
e sujeitou seu
parceiro de corredor e invernada
pra se apear junto a
aguada onde esperava um senhor
Já sem lenço e
tirador, porém com a mesma mirada.
Disse o tropeiro em
saludo:
– Que linda marca - paisano!
– Como não... disse
o vaqueano na mais perfeita saudade.
(e um turbilhão de
verdade percorreu céu e memória)
Trazia um rádio de
história numa chamarra bonita
coisas que o vento e
a escrita colheram ao tempo do couro
e não sabia o
tropeiro que estava diante do autor
do hino do corredor
onde nasceu o Quintino
e onde morreu
Gratulino nunca falou-se aramaico,
desconhecemos o
hebraico – genuína prece de ouro
ouvimos Rincão dos
Touro e saboreamos o arcaico.
Por isso Chico Botelho...
precoce sábio da escrita,
nessa mensagem
infinita que te alcança o cavalheiro
chega o poder e o
dinheiro que traduzimos ao pó...
na poesia do só,
formarás o teu mosaico
e saboreando o
arcaico do céu azul que cativa
tua palavra está
viva e a sombra fala Aramaico.
Lisandro Amaral
20 de novembro de
2012