Pretensão de gaúcho identificar que esta terra seja minha. Mas, a comoção de ver que sobre ela chove novamente, me faz comemorá-la, como filho e dono deste espírito índio que grita de orgulho o real sentido de querer bem a própria terra:
Q U E R Ê N C I A... minha QUERÊNCIA.
Provavelmente alguém estudará os motivos técnicos meteorológicos que promovem as estiagens e nos privam das aguadas abundantes. Portanto, a meu ver, jamais teremos a exata conclusão de por qual razão as águas dos olhos celestes pingam fortes em vários lugares e desviam nosso território durante significantes meses.
Chove na minha Bagé... São vinte três horas e treze minutos e as águas fortes do céu de 7 de junho umedecem campos e gelam ainda mais os lombos noturnos. "Cozas del campo" como diria José Larralde o pensador "pensador y gaucho" como poucos.
Chove na nossa terra... e a emoção de vê-la respirando, qual os peixes, reinicia a esperança de quem planta e a previsão de quem cria o fruto principal da razão rural deste pedaço de mundo.
"No entende la industria de criar hacienda sin un limpio orgullo de sangre campera.” (Osíris Rodriguez Castillos)
Amanhã o sol chegará... Tímido, mas o ar será de um outono revigorando a natureza que sofreu.
(tropeando a lonjura o tempo que berra, fareja uma encerra que o vento procura e a chuva madura traz cheiro de terra e a chuva madura traz cheiro de terra...)
Jayme Caetano Braun, sábio de almas e campos, nestes versos, musicados pelo importante Leonel Gomez e marcados na voz do inconfundível Luiz Marenco, ofereceu-me, na infância, a imagem de um final de seca...
Cantei este chamamé quando gurizote, e jamais imaginaria o meu destino de cantar clamando o bem da terra e de seus inocentes filhos plantadores de incertezas.
Chove sobre minha gente, sem maior ou menor chamamento que as preces ajoelhadas na sede dos campos e no empoeirado das vilas que clamam coqueando baldes e mendigando água aos carros-pipas restos de aguadas aprisionadas no projeto de melhorias...
Chove a sede no rosto de quem não colhe, secam couros revestindo as ossamentas na morte da criação...
Chove na minha querência e a postura é a de gaúcho, que na média é religioso quando sofre ou emociona-se ao renascimento do verde.
Agradeço... em nome de tantos que não agradecerão por inocentes sobreviventes do caminho dos andejos campestres...
Não há tempo pra chorar, gaúcho... Caminha!
O tempo é tempo e chora às vezes...
sou teu filho e rezo à ti - irmão dos campos -
que me faz poema em prece onde estivestes
procurando o pasto vivo em alimento
e as aguadas pra evitar a dor das reses...
Chove na minha terra, necessito ser gaúcho e ter Q U E R Ê N C I A.
Em várias edições da importante Expofeira de Bagé fui solicitado, como compositor, para criar algo sobre o histórico dessa feira que encaminha-se a um século de existência. Em todas as vezes que compus, deixei claro meu linguajar não comercial, e sim, simbólico manifesto em nome da emocionante arte de representar, cantando o campo, seus frutos e trabalhadores, sem distinguir preferência.
A seguir, o texto que ilustrará, este ano, a regravação de uma música composta há alguns anos para a citada feira.
Divulgo para os leitores do Diário Do Andante, na intenção de contaminá-los positivamente com a necessidade de aproximarmos os momentos de descanso, ao cultivo importante de adorar as águas e os elementos que nos são entregues pela natureza, para que vivendo deles e com eles, cultivemos o alimento físico e espiritual.
CAMPO
No momento em que te escrevo, campo...
Chora o céu sobre teu colo, necessitado de lágrimas.
É a tão esperada benção aos semeadores de gado e aos tropeiros de sementes...
Há quanto tempo minha gente ronda o céu e ama o campo?
Há quanto tempo escrevem e cantam, no ritual de criar vida e mantê-la aos que virão?
No momento em que, a ti escrevo campo,
muitos outros choram juntos, o recomeço do verde
e o renascimento da poesia de criar...
Na epopéia crioula de mantermos vivo o cenário dos anteriores - filhos da terra –
tropeçamos muito... e levantamos tantas vezes,
motivados pela história colorida dos avós em preto e branco.
No momento em que me ouves - campo –
estou falando por bons séculos de genuínos bravos "de a cavalo"
e estou nos ventres das mulheres que geraram nosso significado de ser...
campo e vida.
Há quanto tempo minha gente ronda o céu e ama o campo?
Há quanto tempo escrevem e cantam, no ritual de criar vida e mantê-la, viva, aos que virão?
No momento em que te escrevo, campo...
Chora o céu sobre teu colo, necessitado de lágrimas,
É a tão esperada benção aos semeadores de gado e aos tropeiros de sementes...
No momento em que te escrevo, campo...
Chora o céu sobre teu colo, necessitado de lágrimas.
Chora o céu sobre teu colo, necessitado de esperança.
Bagé, 17 de junho de 2011.
Lisandro acabo de ler tuas ricas palavras, parabéns.
ResponderExcluirGrande Abraço
José de Moura
Muito bem escrito. Quem mora na cidade - e quase nunca sai dela - assim como eu não consegue mensurar o valor de coisas tão simples mas não necessárias na vida da gente. Bom seria se pudéssemos todos retomar os olhos de criança que se encantam com os fenômenos mais singelos da natureza. Mas como resgatar algo que não tive? Só nascendo novamente, eu acho. Quem tem esta vivência tão intensa, tão pessoal de "campo" pode se considerar alguém com sorte, diria até abençoado...
ResponderExcluirAté!
Normalmente eu escrevo para expressar o que tuas ideias me transmitem. Mas, hoje, as palavras não foram capazes de achegar-se e traduzir minha emoção... hoje apenas o brilho dos meus olhos conseguiu falar. Teu texto me encanta. Grande abraço!
ResponderExcluirLindas palavras, lindas idéias, lindo texto. Emocionante com certeza, assim como te ouvir cantar.Até!!!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirCoisa mais linda chê, tens uma destreza pra escrever. Tua voz então, é abençoada. Gosto muito de te ouvir cantar.
ResponderExcluirGrande abraço !
Que privilégio colocar as palavras no lugar certo "na rédea" como diria nosso poeta Mauro Moraes !!! Sempre é com renovado prazer que leio teus textos e poemas. ou que escuto teus cantares !!! Ontem mesmo, noite alta, silêncio campeiro, escutei pela milésima vez teu Canto Ancestral !!! Que excelência de canto !!!! Parabéns, Lisandro e fica sempre sob a proteção divina, nos deliciando com tuas canções. Luz e Bem!!!
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