sábado, 11 de fevereiro de 2012

Amadrinhadora

Não é por falta de assunto ou motivação que estive sem escrever ao Diário do Andante, e sim, por tratá-lo como uma nova música. Tem que arrepiar o pelo, tirar a fome...  preciso arredar tudo e atender o corpo e a mente que se modificam de maneira inexplicável. Uns chamam de inspiração, eu prefiro chamar de necessidade ou impulso da palavra.
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Esta semana tive que remendar um potrerito, que arrendo na cercania de Bagé. Levei comigo minha filha de quase 6 anos. Era uma grotinha, onde o gado do campo lindeiro, cruzava no final da tardinha para fazer parador no alto da coxilha do meu potreiro. É lindo mesmo o parador, mas como pago pelo potreiro, para que possa apartar meus cavalos dos demais do estabelecimento, tive que remendar.
Chave de arame, trama e uns pedaços de fios, para a reforma, e o mais importante, a presença da pequena ajudante Maria Rita.
Coisa de pai. Mas, não é que a tipa combina com o campo,  feito a pitanga e a corticeira...?
Sua voz indagando tudo: - Que isso pai? Que flor é essa pai? Porque o gado passa aqui? Pra que isso pai? E lá íamos “de apesito”, tapeando mutuca e ela aos fiascos atacada por um lote de formigas pretas que mudaram a cor do All Star vermelho.        
Viu!!! O pai disse pra tu vir de bota.
Serviço feito. Encilhei duas éguas pra recorrermos toda a extensão gigantesca do meu potrerito de umas braças - que quase abraço de tão grande e de tanto que o quero bem.
Acomodei as estriveiras - pra Maria pata curta - e o tenisinho vermelho parecia um par de botas garrão de potro enfiados acima dos meus estrivos de bronze militar.
Ela sobre uma tordilha (orgulho do domador, um tal de “Amaral que se diz cantor”), eu fazendo caminhar com as garras uma zaininha safada que não gosta de folga... dei o cabresto da tordilha pra Maria, atei as rédeas e, um olho cuidava a zaina o outro a Maria...  falei – bem de mansinho - quando já havia agarrado o cabresto da tordilha pra que andasse ao meu lado: filha a égua do pai quer corcovear, e agora eu tô com o teu cabresto na minha mão... e tu que é minha amadrinhadora...
“- Aiiiii paizinho eu não gosto de ser amadrinhadoraaaa...“
Como diria o Aureliano:
Haaa!
Quando a sorte é mesquinha não hai feitiço que ajude!

Nos fumo naquela toada
nesta dança desgranida
onde um taura arrisca a vida
só pra honrar a patacoada.

Fui conversando co´as duas e, chamando a zaina no bico pra não assustar a minha amadrinhadora,  já não mais ajudante de alambrador...
Foi aí que veio a frase da tarde. Muito melhor que uma metida de cavalo pra aquebrantar um corcóveo!

“- Pai, eu nunca vi um pai tão gaúcho que nem tu!”



Perdoa mestre Aureliano, mas cabe uma adaptação.

Froxô e seguiu troteando.
Quebrada é o fim da zainita.
E eu, paradito, com o tino
A pensar desta maneira:
Por ti, a mais linda trigueira,
Tomo susto a vida inteira
No lombo do meu destino.

                                           foto Edu Rckes                                         edu.rickes@hotmail.com


Nota
Em negrito: fragmentos do poema Romance De Peão, de Aureliano de Figueiredo Pinto, do livro
Romances de Estância e Querência.

10 comentários:

  1. Que coisa linda !,fico imaginando toda a situação,e me imagino estando na mesma situação com meu filho.
    Que coisa bem gaúcha isso!

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  2. Muito lindo.. Ensimanentos de pai para filho Pelo caminho que o pai conhece como a palma da sua mao Cada buraco cada corredor E para o filho tudo novo desde um passaro ate' uma flor..

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  3. Coisa linda, Lisandro!! e ricos filhos por que sabem vocês educar!!

    abraço!
    Vanessa Martins

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  4. Também tenho um Pai Bem gaúcho, e como primeira filha, também seguia seus passos...
    Assim no más...
    Felicidades! Continue assim!
    Susete Leite

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  5. Por momentos voltei a minha infância, nos fins de semana tão esperados, quando íamos pra São Sebastião visitar o Vô, eram momentos mágicos, aprendi muito com meu velho, na volta do campo pra casa,trazendo o gado pra mangueira...saudades do meu avô que já se foi e daquele tempo que não volta mais.
    Abraços!
    Cheila Soares

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  6. Que coisa mais rica !!! Parabéns e obrigada por compartilhar.

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  7. Emocionante, como de costume!

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  8. luis andre de o.garcia.eldorado do sul13 de fevereiro de 2012 às 04:18

    Que coisa linda a lida do campo.passada de pai para filho.parabens lisandro,tudo que tu escreve e emocionante. que saudade do campo.

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  9. Salve nosso poeta "Terrunho"! Que Deus siga abençoando tua alma Gaúcha, teus versos e tua linda família. Cada vez que leio tuas palavras, lavo minha alma. Parabéns e muito obrigado por compartilhar teus momentos e tua poesia conosco. Um fraterno abraço.

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  10. Lisandro,nao ha como nao se emocionar ao ler,ainda mais pra nos que temos o rio grande no sangue,e eu que estou longe do meu pago,um abraço amigo.

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